É preciso enfrentar o preconceito, afirmam membros de Frente de Combate à Depressão

21 AGO 2019Por Osvaldo Júnior18h10

“Pra doido é pau, pra doente é hospital”. O antigo ditado popular foi lembrado pelo psiquiatra Juberty Antonio de Souza para ilustrar o preconceito que ainda existe em relação a pessoas que sofrem de alguma doença mental. O médico participou da reunião de lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Saúde Mental e Combate à Depressão e ao Suicídio, realizada na tarde desta quarta-feira (21) no Plenarinho Deputado Nelito Câmara, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul. Assim como Juberly, os demais participantes consideraram o preconceito um obstáculo que precisa ser enfrentado.

Deputado Marçal Filho discorre sobre a Frente, que coordena

A reunião foi proposta e presidida pelo deputado Marçal Filho (PSDB), coordenador do grupo de trabalho. Durante o evento, representantes de entidades e especialistas no assunto tomaram posse como membros da Frente. Além do médico Juberty de Souza, da Comissão de Ética da Associação Brasileira de Psiquiatria, assinaram o termo de posse o capelão e professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Edilson dos Reis, o defensor público Hiram Nascimento Cabrita de Santana, o vereador de Dourados Sérgio Nogueira (PSDB), e o psiquiatra Marcos Estêvão dos Santos Moura.

Nas falas de todos, o preconceito foi enfatizado como problema a ser enfrentado nas ações relativas à defesa da saúde mental e de combate ao suicídio. Também esse foi o tom da fala do deputado Marçal Filho. “Para uma pessoa, é difícil assumir que sofre de algum tipo de transtorno”, disse, relacionando essa dificuldade ao preconceito. Ele notou, ainda, que o problema que, muitas vezes resulta no suicídio, é visto, comumente, como algo distante. “Falamos das pessoas com depressão como se fossem pessoas distantes. Mas elas podem estar muito próximas, no ambiente de trabalho, em nossas casas”, alertou.

O preconceito, por vezes, transforma-se em ações violentas, como destacou Juberty. “Pra doido é pau, pra doente é hospital. Isso já foi dito muitas vezes por diversas pessoas, como os mais velhos aqui devem se lembrar. Hoje, estamos tentando resgatar a dignidade das pessoas que sofrem de alguma doença mental”, afirmou, acrescentando que, mesmo com os avanços, o preconceito ainda existe. Disso desemboca situações de violência, como casos de pessoas deixadas isoladas em quartinhos. “São trancafiadas, acorrentadas e recebem comida por uma janelinha”, detalhou.

O problema parece invisível apesar de parcela populacional significativa de doentes. “Da população carcerária, cerca de 20% têm doença mental. De cada dez moradores de rua, seis são doentes mentais”, informou o médico. Entre as manifestações desse descaso, estão o fechamento de leitos em hospitais e a ausência de locais para internação. “E o que fazer?”, questiona. Ele mencionou que, como forma de evitar o enfrentamento sério do problema, buscou-se, por vezes, eliminá-lo, através, até mesmo, da morte dos doentes ou de sua transferência para outros locais. "Ônibus lotados já transportaram doentes e o deixaram abandonados em outras cidades, em outros estados".

O capelão e professor Edilson dos Reis, que parabenizou a iniciativa da criação da Frente, também falou da necessidade de sensibilizar as pessoas quanto ao preconceito. “O julgamento mata, mas o apoio acolhe”, disse. "Precisamos ouvir o dor do outro. Toda dor é suportável quando não é em mim”, afirmou. A “escuta” só acontece, muitas vezes, depois do suicídio. “É preciso que a pessoa morra para ser ouvida”, acrescentou o capelão. “A pior coisa é deixar de existir por ser morto pela dor”, finalizou.

Juberty: "Estamos tentando resgatar a dignidade dessas pessoas"

O defensor público Hiram comentou que, devido ao preconceito, a doença mental não é vista como doença grave, tal como as pessoas consideram o câncer, por exemplo. “Isso faz com a pessoa com depressão ou alguma outra doença mental fique isolada em seu pedido de socorro. Os familiares e pessoas próximas dizem que é falta de vontade, que a pessoa precisa agir, fazer alguma coisa. E o próprio doente evitar se expor para não dar sinal de fraqueza”, considerou. Ele completou que o problema é ainda mais grave para a grande parcela da população, que depende dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). “Ficam na área verde, por não ser considerado situação urgente”.

O psiquiatra Marcos Estêvão mencionou dado da Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo o qual a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio. “Precisamos, sim, reduzir essa taxa, através de programas como a dessa Frente Parlamentar. Precisamos de maior intervenção com foco preventivo”, salientou. Também para ele, o preconceito dificulta o trabalho necessário para diminuir as estatísticas de suicídio. Devido ao preconceito, são reduzidos os locais de tratamos. “E onde está o preconceito? Está na sociedade como todo. Ele diminuiu, mas ainda existe”, reforçou.

O vereador Sérgio Nogueira, que enfatizou a importância da Frente Parlamentar no combate à doença mental, comprometeu-se a ajudar no avanço dos trabalhos. “A União das Câmaras de Vereadores de Mato Grosso do Sul, que reúne 845 vereadores, estará com as portas abertas para que essa frente parlamentar. Podemos realizar seminários e outras ações. Também vamos levar adiante o desafio de termos em cada Câmara ao menos três vereadores trabalhando de forma afinada com essa frente”, disse.

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