"Quem entende de Educação é professor", diz Gleice ao pedir resposta sobre obra apreendida

Deputada estadual é autora de requerimento de informações ao Governo do Estado sobre destinação dos exemplares do Avesso da Pele adquiridos com recursos públicos e posteriormente recolhidos de 75 escolas estaduais de MS

23 ABR 2024Por Danúbia Burema13h03

“Nós precisamos começar a respeitar as profissões uns dos outros. Precisamos entender que quem entende de medicina é médico, mas quem entende de educação são os educadores”. Foi assim que a deputada estadual Gleice Jane (PT) usou a tribuna da ALEMS (Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul) para falar de seu requerimento pedindo informações ao Governo do Estado sobre a retirada da obra o Avesso da Pele, que motivou debate nacional.

“Vim esclarecer essa polêmica sobre a reclamação de deputados que não leram livro ou não leram o requerimento. Em momento algum no requerimento esta solicitando a volta do livro”, enfatizou, mesmo sob a ressalva de que em diversos outros estados os governos já devolveram o material às escolas.

De acordo com ela, entre os questionamentos do requerimento está se na análise da obra foi constituída uma comissão de profissionais com competência de análise crítica literária ou ao menos ligada à área da educação. “Estou perguntando se teve uma análise crítica, profissional, técnica e científica do livro”, ressaltou.

Além do recolhimento, o documento protocolado pela parlamentar questiona se foi realizada investigação para ouvir a motivação dos profissionais das 75 escolas de MS que escolheram o título que, por sua vez, estava inserido dentro do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático). “Estou perguntando porquê os professores pediram esses livros que já foram analisados e estudados por uma comissão nacional, durante o governo Bolsonaro inclusive”, pontua.

O texto também questiona se o recolhimento é uma decisão definitiva. E, se sim, qual o destino dos livros comprados com recurso publico para incrementar ensino e aprendizado. Ainda questiona se para análise foi usado sistema de classificação indicativa regulamentada pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e disciplinada por portarias do Ministério da Justiça e Segurança Pública. 

Debate com base na ciência

Na tribuna, Gleice defendeu o debate em torno do tema levando-se em consideração os profissionais da área. “Não se pode tomar decisões sobre educação sem dialogar com profissionais da pauta da educação”, pontuou.

“O senhor iria pra uma consulta com um médico que não é formado? Teria coragem de se submeter a uma cirurgia cardíaca ou um procedimento de um profissional que não é da área?”, questionou os colegas deputados. Na sequência, destacou que as escolas são estruturadas com base na ciência, são séculos e séculos de estudo, de pesquisa, além do tempo de formação dos professores. “Então é necessário respeitar quem tem esse preparo, porque quando a gente não respeita, pode matar gerações e gerações”, alertou.

Realidade das salas de aula

Em sua fala, Gleice disse que enquanto lia o livro lembrou-se de inúmeros casos vividos enquanto lecionava na rede pública de ensino. “As meninas engravidam é no 8º ano, não é depois dos 21, então é ali que a gente precisa conversar sobre esses assuntos”, ponderou a deputada. Na avaliação dela, não enfrentar essa discussão significa permitir que elas continuem enfrentando a gravidez na adolescência e se afastando da escola.

Dentre os casos que vivenciou em sala, a deputada lembrou-se de uma aluna que relatou não conseguir fazer a tarefa porque ao sair da escola tinha que fazer almoço, lavar louça, limpar a casa e, quando terminava o trabalho, já tinha que começar a preparar a janta. “Ela tinha 15 anos, era casada e morava na casa do adolescente e era explorada pela família. E essa história foi relatada no livro”, contou. “Lembrei da história de outra adolescente que disse ‘professora sou casada também desde os 13 anos com um homem de 47 anos’. Essas são as historias que a gente tem na escola. Essa é a vida real da escola pública. É isso que acontece”, detalhou.

Conforme a parlamentar, que leu a obra em questão, o livro traz questionamentos que transcendem as ‘três linhas de frases que trazem palavrões e apelidos que são ditos pelos meninos em salas de aula constantemente’. “A pauta não é sobre sexo, é sobre cor da pele, sobre a realidade. As cenas de sexo retratam uma adolescente explorada pela família, uma mulher que está em tratamento de câncer e se relacionando com o amante porque o marido a abandonou. O livro traz uma quantidade enorme de conteúdo”, relatou.

“O que eu estou dizendo pra vocês é que a realidade da escola não é o que a gente imagina, ela é cruel, é real e a gente precisa debater com profissionais que conhecem a realidade. E não da pra gente pensar politica para o interior das escolas sem debater com as pessoas que lá estão. O que eu quero é que a educação seja respeitada na sua necessidade. E que os profissionais que estão em sua atividade profissional sejam respeitados”, finalizou.

Após a fala da deputada, foi deliberado que o requerimento por ela apresentado será submetido à Comissão de Educação da ALEMS para que por meio desta seja encaminhado à SED (Secretaria de Estado de Educação).

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